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sábado, 26 de junho de 2010

trecho a|calmo

Continuas de mãos vazias, em que a magia não entra no teu sorriso. Chamas-te nenhum nome, pareces-me tão ninguém, desconhecida que me é familiar. Estás-me desperta, encanto em que tanto me desejo transfigurar. Aparentas ser a minha quietude, mas não és, mas não és. Trazes correntes na tua língua da razão. Sem magia, cortas-me o coração a meio. Gosto, gosto dessa pedra que carregas no peito.

Sentas-te à porta, esperando que chegue a morte do dia. Aguardas que te encha a boca de flores, que te preencha o vazio que te fica no âmago, tão sólito, tão teu. Carpir um desejo, a ânsia estendida ao sabor das ébrias batidas do peito. Esperas, esperas como eu espero por ti, pela noite que chega nos seus dedos de veludo e nos sussurre, fechados, escondidos, clamados a sós.

Não me falas, nem espero que existas para além do meu rosto, cansado, nos olhos oferecidos ao mundo, ao esquecido que sou. Vou dizendo que sim, repetindo-me neste aceitar que o sol me seque a boca, sem que a beijes, sem que... te esqueça. Pareces-me tão bem, inspirar-te em falta, dilacerar-me deste jeito que me trazes ao coração que vive na garganta, tranquilo.

Agora que as palavras me parecem menos estranhas, a língua menos áspera, sinto-me mais plano. Sim, tranquilo, como o verdadeiro homem que espera numa estação isolada da linha. As paredes vazias de ti, despidas da tua presença, desta dor tão calma com que te fazes notar. Dei-te já tantos nomes, tendo a solidão apenas um, o meu. Ofereci-te a tantas noite enfim, à incomensurável medida do amor.

Continuas assim, de mãos vazias e sorriso alheio à magia. De joelhos escanzelados, descalça de qualquer tipo de reflexão quanto ao tempo que ainda falta para que chegue a noite. Eu, por entre o veludo tua pele, desejo a tua boca, mordendo-me em qualquer sentido que tenha na alma. Porque de nada já importa residir num vago olhar lançado ao arvoredo, se lá não estás entre os bichos da madrugada. Mesmo sem resistir à dúvida enciumada, se tanto me fixas o olhar, apenas para que consigas tocar a lua, ou se espelham apenas quem tu és.

Agora sim, tranquilo nesta estranheza que me embarga, enovelado na maciez tua paixão. Pinta-me este sanguíneo traço no ar, o lastro férreo guardado na boca, seguindo cada passo um do outro, um no outro. Aparentas iluminar cada recôndito desejo que exista por entre este meu mundo, quando apenas alumias a triste flor pendurada no teu cabelo.

És tão bonita, tão bela no teu desarraigado soluço, no teu perfume que me soa a violeta mortiça. O teu corpo escondido neste meu pesar. Desjeitosa, gemes em parcimonioso êxtase, sublimas a avidez numa brisa calada. Gosto. Gosto quando tudo anulas e te ofereces num todo, neste tanto que te sou. Tranquilo te trago na saliva, nas inexistentes palavras entre nós. Tranquilo, tranquilo me deixas na dor, neste vadio tanto querer.

quinta-feira, 24 de junho de 2010

epitáfios

Hoje apeteces-me inteira num cigarro
Hoje apeteces-me contida na minha sombra
Hoje apeteces-me apenas...

Seres nudez, pele, silhueta descalça do exterior
Preencho-te. Apago-te. Volto a preencher-te para apagar de novo
Num retorno ao vazio de um gesto, à ausência de tempo num olhar partilhado
Encho-te de suspiros. E olho-te. Olho-te como se nunca mais te fosse ver
Como se morrêssemos. Ali, entre purgas. Aqui, entre lágrimas, sem despedida

Hoje apeteces-me viva no sonho
Hoje apeteces-me, entre estes olhos fechados
Hoje apeteces-me apenas...

Transbordares sal, e nos teus olhos molhar os meus lábios
Trazeres-me este mal à boca, à tona da voz que se some de vez
Consome-se a delicadeza, o que me dás de mansinho
Enche-me, perfaz-me, dizes-me tão lindo
Nos lábios rendidos, nos corpos estendidos, ali ficarmos

Hoje apeteces-me perdida de mim
Hoje apeteces-me feita de amanhã
Hoje apeteces-me...

Há dias que não sei de mim. O que me faz ser isto. Isto!
Em todos os adornos, armaduras, contrastes e desmedidas esconjuras
Fugindo para que me procure. Esse teu ventre retira-me da cegueira.
E tanto que me apeteces no começo, e mais me apetece no fim
Sem brevidades, porque as boas histórias não se escrevem, vivem-se

Hoje apeteces-me viva
Hoje apeteces-me não mais recordar-te assim
Hoje apetecias-me tanto...

terça-feira, 22 de junho de 2010

desassossegos

Se a minha Alma fosse por aí adentro.
Desalmadamente por aí adentro.
Sem paragens de mercúrios.
Sem sentidos de pensamentos.
Ai se ela fosse por aí adentro.
Sem traços de passados.
E medos de futuros.
E pousasse assim.
Devagar no soalho da tua mão.
De palmas em concha.
Com cheiros de amoras.
Ai se ela fosse. Assim. Por aí adentro.
Frágil com alicerces de veias.
Desalmadamente por aí adentro.
Fugaz. Vermelha. Viva.
Aos saltos por aí adentro.
Absorvida pelo desejo.
De te encontrar entre os meus dedos.
E assim. Só assim.
Sossegar a pele.
Ai se ela fosse.
Desalmadamente tua
Por aí adentro.

Se a tua alma fosse minha.
Descompassada, em jeito triste.
De olhos em riste para a lua.
Sem adornos dos dias que te gastam.
Oh, se sobrevivesse mais um dia, a um trago teu que fosse.
Ao limite dos teus olhos amêndoa. No beijo que me dás amargo.
Saberia guardar-te entre despojos.
Que do teu deserto guardo miragem.
Passados teus cravados na pele.
Se essa alma me coubesse no corpo.
Oh, como seria o meu sangue tão mais espesso.
Saber-te-ia larápio do meu sossego.
Calado. Absoluto, e no entanto, tão e somente disperso.
Reencarnar-te. Dançar nos teus ossos.
Saber-te até ao último grão de areia.
Nas tuas sombras lazúli. Na tez trigueira de quem evapora ao sol.
Gastador de palavras. Dorso alongado entre meus dedos.
Se essa alma fosse também minha.
Aprouvesse a lívida brancura tornar-se escarlate.
Gotejante desmesura. Transformar-te em carne.
Vivo.Sereno. Perene. Esquecer-te dentro de mim.
Oh, se toda ela estivesse em mim.
Assim. Só assim.

Se estas mãos fossem espíritos.
Estas quatro, tramadas a quente.
Pousar-te a mão na alma, lavando-me no teu rosto.
Parir cada murmurado segredo.
Criar-te para cada medo.
Se estas almas fossem mãos.
Frutado. Tanino. Lastro veludo o teu manto.
Duas mãos abertas. Um aceno apenas.
Assim. Só assim.
Reclamar esta pena em fuste, no coração
Premer-te. Calcar-te sobre mim.
Se cada dedo fosse um desejo.
Morder-te as mãos da alma.
Despejar cada abraço, como o rio que se oferece ao mar.
E esse ar a outro respirar.
Solfeja-me.
Ai alma sombria que me acalentas a morte.
Cor essa que tens aí dentro.
Essa. Só essa.
Se estas almas fossem por aí adentro.
Onde te misturas em mim.
Oh, que nos meus ais seria tua.
Tua. Desalmadamente na alma.

domingo, 20 de junho de 2010

zimbro

Sou serpente que te ladeia, rodeia, sibila ao ouvido, venenos tremendos, sem mãos, nem pausas, porque de vírgulas lembram-se outros tempos, sem enredos, tramas, intrigas, vozes sussurradas. Atroz, traz a mim, deste nós criado, lânguido, lambido, a sós, a dois, tu e eu. Somos vozes, ecos, resquícios, afins, esconjuras, partituras, danças sem pares.

Sou homem que te acentua, assente por este corpo, nesta língua, que de absintos sou crente, e tu, meu veneno presente, dá-me de beber. Sou forte, sou fraco, sou quem sou e nem a ti sei dizer-te mais que uma recorrente lábia, corrente, escorrendo-me em torrente que me emerge pela boca, esta, esta, esta repetição de gestos lambidos.

Sou vontade que te abre, consome, envolve, vontade maldita de te explorar, exaurir, escadear cada traço teu, no meu, neste meu, álcool que me tributa a carne, sem cerne nem desarme. Vem nos teus dedos, e com calma, toma-me e sente, como posso ser eterno, sem que efémero esteja a dizer-te, que nos meus olhos me morreram amores, dissabores e outros fins a que me dei.

Sou gesto jazido, trazido ao de cima, e em baixo tenho uma vontade carnal, expectante, sem redundâncias ou horas, dispostas entre nós, entre corpos, entre lençóis suados a tanto, e por tanto e muito mais te escrevo entre as minhas pernas. O tacto, sentido, num toque, inverte-me nesta orla que se faz tua, tua a minha vontade de te ter nua.

Sou presente, recorrente na crença que se adensa no coração ao sopro do teu pulmão. Outro tenho, singular, restrito, prostrado, bendito momento em que as mãos se me adensam mais que a consciência. Oiço-te no vazio que se instala em mim. Quero mais.

Sou intenção, tenho vontades, sonhos a descobrir, e a descoberto me dou, em ensejo, de jeito troçado, por outros, os que me habitam, mas vivem à espera que vença, valide quem sou. Coloca-me as mãos nas rédeas, preciso parar, colmatar a solidão num beijo teu. Dá-me a soltura que me falta, por ti, em ti, bem dentro, mais fundo, gutural te clamo neste sentido, até te atingir, quem devo chamar quando me venho, e tenho em mim parte tua, desta mão que te escreve, bem depressa, sem mazelas na pele, e descreve-se em círculos, sucintos limites da própria noite.

Sou, apenas o sou.

quinta-feira, 17 de junho de 2010

hoje...

...declarei-me.

Larguei palavras e fui directo.

Só isso.

Tu.

terça-feira, 15 de junho de 2010

na primeira pessoa

Não sei se me farte de sentir, ou se me enfarte por um Outubro de folhas caídas. Restam-me dúvidas, e este receio de morrer estúpido. Mais ainda de quando traguei o mundo, degrada-me mais depressa todo o processo de pensamento. É sentir-me ilógico, fraco, mortal.

Pensei que já soubesse lidar comigo, mas não, não sei. Assim como não sei o que fazer a esta ânsia, quando me falta o ar e dou comigo frente ao mesmo espelho de sempre, repetindo o meu nome, até que caia no desgaste de me chamar.

Porquê? Porque me encerro para explodir. Porque me abro ao mundo para me conter. Dá-me esta vontade mal canalizada para me querer riscar aqui mesmo. Aqui. Aqui, Marco. Risca-te aqui, já. Repete-te. De novo, repete! Repete-me. Lava-te nas mesmas águas, procura sobre a mesma pele em que acordas.

E pior, deixo-me cair. Levanto-me. Repete-te, Marco... aqui, bem baixinho. Segreda-te nos medos que assim te assolam. Estás descalço. Bem sabes que te encontras de coração nas mãos. Lambe esses lábios que tanto desejam entrega. Solta esse cabelo. Solta. Solta-te. Repete! Repete-me de novo.

Conheces estes passos, todos os baixos e venenos. Toma-te, que este trago é unicamente teu. Sabes-me bem. Nesses olhos, no olhar que escondes, o que sempre escondes. Mostra. Mostra-te, porque o teu suicídio é esse tão bem saber viver. Faz-te mal tão bem querer. E tão bem que o mal te faz, estremeceres de receios e dos demais incrementos do amor.

Escolhe-te, sem que te recolhas entre as paredes. Percorre-te a sós, um minuto antes da entrega. Toca-te. Tocas-me como nem eu me sei tocar. Sabes tão bem, bem sabes como te reescrever por entre húmidas paredes. Contraria-te e contraio-me. Sal, suor e lágrimas. Sangue, veias, gemidos e vazios. Sussurra-te, que te quero em voz perdida, quando estendes a língua aqui. Aqui. Aqui, Marco! Não sabes parar. Não te esqueces de me deixar de ouvir. Rasga. Rasga-te até onde te fundes em mim. Rasga-me, que não quero mais ser estátua icólume ao teu sentido.

Sente. Sente-me por entre os teus dedos, esvaindo-me a cada trago aflito. Nos teus, guardares toda a noção que me ofereces, perder-me para ti. Cai, desejo-te em queda, de joelhos no chão. Puxar-te para mim. Para mim. Porque te quero ver assim, na segunda pessoa do singular, sabendo-te tão bem sentir a primeira.

Concentra-te, esquece quem sou, o que tu és. Levas-me daqui, para ti. Trazes-me recordações de boas maneiras. Outros tempos em que soubeste o que era a entrega. Encantas-te ao espelho, mirando esse flanco desprovido de pele, vidro ou armadura. Ensejo oferecido a outras mãos. Desejo desenhado a outros dedos. Aproxima. Aproxima-te. Permite o toque de morte, Marco. Repete-te como da primeira vez, em que tanto soubeste diluir o teu sorrir.

Eleva-te. Leva-me. Sublime despertar madrigal, que tens couro e corpo sedento de vaidades. Desejo absoluto de gritar essa chama aflita que te enrola a garganta. Arde o mundo, tu nasces. Exaspero no tempo que demoras a roçar-te por mim. De mim já nem sei, sabendo que para ti sou-te presente.

Enlouquece. Enlouquece-me neste aperto agudo. Tortura-me com esta ausência, mas tão presente me floresces na pele. Arrepias-me. Calas-me o vazio, preenches-me os frios da alma. Corrompes quem sou, vencendo-te na gota que te encharca. Crê. Quero-te. Grita-te. Mais. Mais! Mais! Grita-me no pulmões que tens para te sentires dentro de mim. Morre e mata-me, com amor.

Só assim te sei escrever, com tanto engelho e engenhos de jamais perderes a noção desse teu nome. Só assim, de cada vez que estendes as mãos para fora do teu peito, arrancando pedaços à terra que te fez à imagem da lua. Enlutas preconceitos. Demoras os beijos, de braços abertos à luz. Que as lembrança não te corroam as vitórias. As despedidas, mesmo que breves, não te afastem o medo, nem a luz dos teus olhos.

Queda-se a justeza menor à estranha incapacidade de me saber lidar frente ao espelho. Que todo o pesadelo me lateje de vez na cabeça. Arranca-me deste peito, Marco. Arranca-me daqui para ali. Mais além. Mais! Quero-me mais em ti, nestes meus ossos. Com toda esta dor de me refazer à imagem do Homem. Dói-me tanto, tanto que é sentir-me bem.

sexta-feira, 4 de junho de 2010

p.u.t.a.

Ouvi dizer que se segredavam coisas bonitas por aqui. Constou-me que todas as flores eram quase como orgasmos ao olfacto. Emprenhei pelos ouvidos, e perdendo a última hora de sol, constatei que de enganos assim, afundaram-se mais almas que homens. Não é qualquer coração capaz de amar. Não é qualquer coração capaz de disciplinar a própria dor. Apenas porque a dor, essa, não passa para além do seu conteúdo, mas extravasa-se em incongruências e metásteses sentimentais.

Ouvi dizer que mandaste alguém à minha pergunta. Procurei-te, como quem quer achar o que não deve, mas deve procurar o que não sabe. Desconheço alguma semelhança com outro senão comigo mesmo, porque já nem nome trago vestido quando no teu encalço. Já nada me parece natural, mas tudo, tudo em ti me fazia lembrar... enfim, a ti.

Desenhei-te a boca para que me respondesses se eras tu realmente que ali estavas à minha espera, eis que me trespassas de morte. Sorriste. Desenganem-se, abstémios, correctos, religiosos, meninos de luz e meninas de jardim. Não oiçam o que se diz por aí, que sou um homem de mil vidas e de outras mil que sobrevivi. Já há dias em que me sinto pálido e doente. Esta doença, nesta doença, só por esta que me faz viver.

Sombras, silhuetas e nódoas camufladas nas léguas que possui a língua. Açulando as intenções em maus lençóis e outros propósitos de companhias. Sinto a pele esfriar durante a madrugada já quase vencida. Poderia considera-me fino, se restasse em mim um apêndice de bom comportamento, algum composto de imaculada pose de inatingível. Pois sim, que um homem é feito de coluna vertebral, dizem. Mas a espinha adorna-se às camas em que se deita a vontade.

E vontade esta que me desassossega até aqui, onde me sinto tenso, rijo e seguro de morrer aqui e agora. Não fosse ser tão pouco dado a crenças, acostumar-me-ia ao flagelo da penitência, como um charlatão que vende a própria mãe ao Diabo. Absolva-se qualquer desejo escorreito, sem quebrar a promessa de um dia inventar-me melhor.

O odor que emana a tua pele, parecendo segredo escondido do medo. O medo escondido do nome. O nome escondido de quem somos. O que somos catalogado em perfumes. Não se lhes encontra sentido, porque apenas importa a que cheiram. Encerro-me de vontade, contra este peito que se diz aberto, encostando no teu. Vontade espartana de te agarrar pelo cabelo, puxar-te com força para mim. Morderes-me os dedos, como freios a que tua boca não se padece.

A que este lato pensamento me leva, de gostar do cheiro que deixas nos meus dedos, na minha boca. Talvez seja como beijar o céu, extraír um pouco de ti, a cada vez que respiras. Finges dormir. Ousas dizer que me conheces, enquanto troçamos do mundo. Abaixo a humanidade. Queimem-se princípios, porque os fins conseguem-se mudar. Conspira-se mais um pouco, enquanto folga o corpo. Inspira-se em tom de bons modos, o cheiro da erva fresca na tua pele. Amargas. Amargas-me. Deixa-me ao corrente dos teus esfregaços por mim. Dedadas minhas por ti, decalques da intenção de te querer mais. Magoar-te porque és minha. És minha. És minha.

Sendo coração que nada mais alcança, olhos de sentir as fráguas de esquecidos infortúnios. Qual braço forte, se nesta correnteza apenas jazem enjeitos e tristezas. Acomodam-se os sentimentos aos cortumes de um amor prolongado, magarefe. Um vazio pautado por um querer mais além do compreensível. Falo eu de coisas contrárias, julgando-me perante os teus pés, pelas linhas avessas que nos coseram.

Porque de acrónimos se fizesse a minha cabeça, serias sempre puta para mim. Porque uma tarde abalaste.